O potencial da planta Agave na industrialização e sustentabilidade do Semiárido da Bahia
Um novo projeto de fabricação de biocombustíveis produzidos através da exploração do Agave - planta da qual são feitas manualmente fibras de sisal utilizadas como matéria-prima de peças de artesanato - deverá ser o principal agente de transformação da indústria no Nordeste do país, nos próximos anos.
O Agave é um tipo de suculenta típica de regiões semiáridas como o México, onde é utilizado para a produção de tequila. No interior da Bahia, área em que também é cultivado, é bastante utilizado para a produção de fibras para criação de peças de artesanato. Atualmente, o Brasil é o maior produtor de fibra de sisal do mundo, com cerca de 80 mil toneladas por ano.
No entanto, apenas 5% das fibras da biomassa da planta são aproveitadas na Bahia para a produção das fibras de sisal. Os outros 95% são descartados. Pesquisadores da Unicamp descobriram que esse resíduo é riquíssimo em matéria-prima para produção de biocombustível. O potencial energético da biomassa do Agave é comparável ao da cana-de-açúcar, com a vantagem de demandar 80% menos irrigação e uso de fertilizantes.
A estimativa é que, em um hectare de agave, seja possível produzir 7,4 mil litros de etanol de primeira e segunda geração por ano. Em cinco anos, a cultura do Agave poderá render, por hectare, a produção de 880 toneladas de biomassa, armazenando 617 toneladas de água e fazendo a captura 385 toneladas de carbono.
Para construir um futuro próspero e sustentável na região mais seca do Brasil, o Programa BRAVE (Brazilian Agave Development ou Desenvolvimento de Agave no Brasil), desenvolvido pela Shell Brasil em conjunto com a Unicamp e o SENAI CIMATEC, tem como objetivo utilizar todo o potencial da planta como fonte de biomassa para a produção de etanol, biogás e outros derivados. O Programa BRAVE projetou a dinâmica de uma biorrefinaria que vai utilizar tudo o que o agave oferece, desde a pinha até as folhas.
A primeira etapa do programa começou com pesquisas na Unicamp, dedicada aos aspectos biológicos do Agave, como caracterização de suas variedades, sequenciamento e melhoramento genético, desenvolvimento de mudas por baixo custo, análise do potencial energético, processo de fermentação e análise do ciclo de vida da planta.
A segunda etapa, lançada no dia 13 de abril, foi voltada para a criação dos processos de mecanização do plantio e da colheita e aperfeiçoamento do cultivo do agave, com estudos sobre a aplicação de técnicas agrícolas e manejo de colheitas (BRAVE Mec); e à produção industrial dos biocombustíveis, desde a otimização da produção de bioetanol de primeira e segunda geração até a instalação de plantas-piloto para testes e validação de processos (BRAVE Ind).
O BRAVE Mec vai gerar soluções tecnológicas para processos que hoje são executados de forma manual ou utilizando implementos de baixo nível tecnológico. No caso do plantio, o projeto vai partir de um equipamento que já existe comercialmente e fazer adaptações para que funcione com as mudas do Agave. Para a colheita da planta, será desenvolvido um equipamento específico, que será testado no campo experimental.
Em paralelo, o BRAVE Ind prevê desenvolver a rota de processamento do Agave para obtenção do etanol, biogás e outros coprodutos. O propósito é utilizar 100% do potencial da planta, visando a criação de tecnologias que vão impulsionar a implantação de uma nova cadeia de negócios. As pesquisas estão sendo realizadas em parceria com o SENAI CIMATEC Sertão, novo campus do SENAI CIMATEC projetado para levar tecnologia e inovação de produção industrial para exploração do potencial do Semiárido da Bahia. A intenção é criar condições técnicas, econômicas, sociais e ambientais que fortaleçam o setor, com geração de emprego e renda para as comunidades locais, e sustentabilidade ambiental.
Com duração prevista de cinco anos e investimento de aproximadamente de R$ 100 milhões, o Programa BRAVE é financiado pela Shell Brasil, utilizando recursos oriundos da cláusula de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e da EMBRAPII, para pesquisas biológicas, agrárias e industriais.
A implantação total do programa pode viabilizar uma nova industrialização para o Nordeste do país, na qual será possível conciliar desenvolvimento econômico com sustentabilidade ambiental. Ao utilizar uma planta que se adapta bem ao clima e solo do sertão nordestino e que demanda menos água e fertilizantes que outras culturas, o BRAVE contribui para a preservação dos recursos naturais da região.
Em um momento em que a crise climática é uma realidade cada vez mais preocupante, o modelo do programa BRAVE e do SENAI CIMATEC Sertão é um exemplo de como é possível encontrar soluções inovadoras e transformadoras para enfrentar desafios ambientais e sociais. Ao investir em produção de biocombustíveis e proporcionar desenvolvimento industrial e econômico de impacto nacional, o Brasil confirma seu protagonismo como produtor de biocombustíveis comprometido com a transição para uma economia de baixo carbono, contribuindo para um futuro mais justo e próspero.
André Oliveira é Gerente Executivo de Petróleo & Gás e Mineração no SENAI CIMATEC. Engenheiro Mecânico, com Mestrado em Energia e Doutorado em Modelagem Computacional na área de Sustentabilidade, atua há mais de 30 anos em Estratégia, Desenvolvimento e Gestão de Negócios, Empreendedorismo & Inovação, HSE, projetos de PD&I, Serviços Tecnológicos, nas áreas de Energia, Petróleo & Gás e Sustentabilidade.